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  • TRANSPORTE PÚBLICO: O SISTEMA CIRCULATÓRIO DO ORGANISMO URBANO

    Acompanhava uma das últimas lives da Prefeitura de Porto Alegre, na qual o então prefeito, Nelson Marchezan Júnior (PSDB), juntamente com o Secretário Extraordinário de Mobilidade Urbana, Rodrigo Mata Tortoriello, apresentava o lançamento do novo pacote de mobilidade urbana. Dentre as autoridades convidadas para esse debate estava o ex-Secretário de Mobilidade e Transportes na cidade de São Paulo e Diretor de Mobilidade Urbana do WRI Ross Center for Sustainable Cities, Sergio Avelleda. Avelleda, logo no início da sua fala, fez uma analogia de extrema simplicidade, porém de uma precisão didática admirável. Segundo ele: “ O transporte público tem uma natureza essencial nas cidades grandes. Ele é fundamental pra manutenção da vitalidade das cidades. Ele funciona como o sistema circulatório no nosso corpo : ele leva o oxigênio para as células…” A partir de tal analogia não pude ouvir mais nada que ele tenha dito nos minutos seguintes. Não porque sua explanação tenha sido desinteressante, muito pelo contrário… Mas pelo fato dessa analogia ter agido sobre a minha mente como um gatilho de tal força que simplesmente abduziu minha atenção por completo, transportando-me de volta à adolescência, durante minhas aulas de biologia na escola. Porém, por motivos óbvios, eu não vou me ater as especificidades do sistema cardiovascular. Primeiramente por não ser esse o intuito do texto e, principalmente, por não ser essa uma das matérias das quais eu guardo as memórias mais recentes. Do contrário, seria inevitável que eu dissesse alguma asneira, pelo menos uma diferente das habituais com as quais os amigos leitores já estão acostumados… O fato é que, quase que imediatamente após a sua fala, algumas reflexões inundaram a minha mente: a primeira é que quem denominou os diferentes tipos de vias urbanas, muito provavelmente, tenha feito a mesma analogia, já que um dos principais tipos de vias urbanas são justamente as arteriais. A partir dessa analogia, uma imensidão de outras tantas tornam-se possíveis. Pensando a cidade como um organismo urbano vivo e numa grande avenida totalmente congestionada pelo fluxo num final de tarde, imaginei que tipos de “angioplastias urbanas” seriam possíveis para resolver essas constantes e cada vez mais graves obstruções arteriais que acometem nossas cidades? O sistema de transporte público é uma questão que precisa de cuidados urgentes e intensivos, não só em âmbito nacional, mas em todo o mundo. Além da já mencionada NECROSE URBANA , a qual, por falta de irrigação de investimentos em infraestrutura, educação e segurança, mata cerca de 1,2 milhões de “células” anualmente, parecemos estar vivenciando também um quadro isquêmico. Quadro de tamanha gravidade, a ponto de fazer com que nenhuma ponte (ou viaduto) de safena mais seja capaz de nos livrar de um iminente infarto do miocárdio.

  • A PRESSA É AMIGA DA INFRAÇÃO

    Caminhar com bom tempo, numa terra bonita, sem pressa, e ter por fim da caminhada um objetivo agradável: eis, de todas as maneiras de viver, aquela que mais me agrada. A frase atribuída ao filósofo suíço Jean Jacques Rousseau, que viveu durante o século XVIII, certamente não se aplica aos dias de hoje por dois motivos simples e que estão intimamente ligados: status e velocidade. Status significa a posição social de um indivíduo, o lugar que ele ocupa na sociedade e é um termo oriundo do latim. Status significa posição de pé, estado, situação ou condição, e é relacionado a um lugar ocupado por uma pessoa na sociedade. Como abordei em “TUNING”: CRIADO A NOSSA IMAGEM E SEMELHANÇA , o humorista e cartunista Maringoni utiliza a figura de um inusitado personagem existente no trânsito: o pedestre. Ele afirma que, por mais incrível que pareça, mesmo tratando-se de uma prática antiquada e obsoleta, ainda existem pessoas que andam a pé! Pés que, segundo o autor, “[…] são aquelas extremidades usadas para se acionar outra parte do corpo humano: os pedais do automóvel”. De forma irônica, ele defende a ideia do automóvel como extensão do próprio corpo, definindo-o como “[…] órgão indispensável do corpo humano, o automóvel rege nossas vidas, mesmo que você não tenha um. Como se sabe, o homem começou andando de quatro, ficou de pé como homo erectus e agora ficou de quatro, novamente. De quatro rodas”. Entretanto, Maringoni adverte quanto à dificuldade em aderir à prática do ato de caminhar, já que, segundo o mesmo, essa é uma prática que necessita que a pessoa fique na posição vertical, posição que não é a natural do corpo humano, ou seja, sentada num banco de automóvel a maior parte do tempo. Por isso, ele elenca uma detalhada série de instruções ensinando, passo-a-passo, a prática de caminhar. Mas, por fim, ele tranquiliza o aspirante a pedestre, incentivando-o a não desistir e afirmando: “Logo você perceberá que essa prática é tão natural quanto respirar ou dirigir”. Já a velocidade há muito deixou de relacionar-se simplesmente, como aprendemos na física, à variação da posição de um objeto no espaço em relação ao tempo. Atualmente, ela é expressa pelo comportamento da sociedade, que pode ser observada até mesmo numa simples fila de caixa. Com a organização do capitalismo moderno houve a aceleração dos ritmos econômicos. Os meios comunicacionais, a cibernética, as relações virtuais e mesmo o avanço tecnológico dos motores, cada vez mais potentes e velozes, representa economia de tempo e distância, o que acabou por legitimar a máxima: tempo é dinheiro. O tempo, tomando o lugar da vida, tornou-se um valor. No entanto, assim como assinala o filósofo alemão Robert Kurz, a aparente economia de tempo que resulta da velocidade trouxe uma inestimável, porém contraditória perda em uma das mais importantes qualidades de nossa vida: a qualidade do próprio tempo de vida. A velocidade, um tema ao qual já dediquei diversos outros textos, transformada em pressa, tem tirado vidas diariamente não apenas de trás dos volantes, mas diante deles também. Certa feita, ao ministrar uma palestra em uma empresa, nas quais o tema invariavelmente acaba migrando para a famosa “indústria da multa”, pedi ao público para que levantassem a mão aqueles que, sinceramente, já haviam cometido alguma infração de trânsito, porém, que essa não houvesse gerado uma autuação. Aparentemente confusos, tanto com a pergunta quanto com o fato de até o palestrante ter levantado a mão, eles se entreolhavam. Até que eu repeti o questionamento para que ficasse bem claro o meu intuito. Eis que percebo uma senhora no público, bem à frente, com os braços cruzados e com um risinho irônico no canto da boca. Volto a repetir a pergunta, dessa vez dirigindo-me especificamente a ela, ao que ela responde: “ Não. Não tenho carteira! “. Então quer dizer que a senhora nunca atravessou fora da faixa de segurança? Durante o sinal vermelho para pedestres? Em meio aos veículos? – questionei-a. O risinho irônico foi aos poucos se transformando num sorriso amarelo e, sem graça, ela foi aos poucos levantando a mão e juntando-se aos demais naquele auditório. O fato de não ser habilitado a conduzir um veículo automotor não exime o pedestre das suas responsabilidades no trânsito. Independente de estar apto a ser autuado por eventuais infrações ou não. Ao perguntar a um cadeirante que perdera o movimento das pernas após atravessar por baixo de uma passarela; ou (caso tivesse a possibilidade de) perguntar a um pedestre distraído que perdera a vida ao atravessar enquanto o sinal estava fechado para ele, se ambos trocariam suas atuais condições pelas anteriores em troca do pagamento de uma multa e a adição de alguns pontos nos seus prontuários, duvido muito que em qualquer um dos casos a resposta seria negativa. Parafraseando o genial Nobel da literatura, José Saramago, “ Não tenhamos pressa, mas não percamos tempo “.

  • DIA DO PEDESTRE: UM LONGO CAMINHO NAS CIDADES

    As datas comemorativas existem para trazer à tona temas que costumam passar despercebidos no cotidiano. Quando falamos sobre o pedestre, isso fica ainda mais evidente: embora caminhar seja uma das formas mais simples de se locomover na cidade, também é uma das mais negligenciadas. Nas metrópoles brasileiras, quem se desloca a pé enfrenta uma série de dificuldades , que vão desde calçadas mal conservadas até a postura imprudente de muitos motoristas. De onde vem o Dia do Pedestre? O Dia do Pedestre é celebrado em 8 de agosto , e tem como objetivo conscientizar a sociedade sobre a importância do respeito ao pedestre e promover a segurança no trânsito para quem anda a pé. A data foi criada no Brasil como uma forma de lembrar que o trânsito vai muito além dos veículos motorizados — ele é um ecossistema de deslocamentos onde o pedestre, paradoxalmente, costuma ser o mais vulnerável e o menos lembrado. A importância da data Ao dar visibilidade ao pedestre, o dia 8 de agosto também escancara um problema estrutural: o planejamento urbano que ainda gira em torno dos carros. A data serve como um convite à reflexão sobre quem deveria, de fato, ser o protagonista nas cidades — e caminhar, que é a forma mais primitiva, democrática e ecológica de locomoção, deveria estar no centro desse debate. Desafios de quem anda a pé Ser pedestre, especialmente nos grandes centros urbanos, é um desafio diário. Calçadas esburacadas, rampas inexistentes, falta de sinalização, iluminação precária, ausência de sombra e até o desrespeito explícito por parte de condutores que avançam sobre a faixa são obstáculos recorrentes. Para pessoas com mobilidade reduzida, idosos ou mães com carrinhos de bebê, a situação se agrava ainda mais. Além da estrutura física, há uma questão cultural envolvida. O pedestre é, muitas vezes, tratado como um " estorvo " no fluxo da cidade, como se sua presença atrapalhasse a eficiência do trânsito. Isso revela o quanto ainda estamos distantes de uma mobilidade verdadeiramente inclusiva. O longo caminho para cidades mais humanas Construir cidades mais amigáveis para os pedestres exige mais do que campanhas pontuais — é preciso vontade política, investimento público e mudança de mentalidade. É preciso entender que cidades caminháveis são também cidades mais saudáveis, mais seguras e mais justas. Urbanistas já apontam que quanto mais espaço damos ao carro, mais ele domina. Por outro lado, quando priorizamos calçadas amplas, travessias seguras, arborização e espaços de convivência, estamos não só facilitando o deslocamento a pé, mas promovendo encontros, fortalecendo o comércio local e dando vida às ruas. Caminhar é um direito A mobilidade a pé não pode ser vista como um plano B ou como uma necessidade apenas de quem não tem carro. Ela é um direito de todos e deve ser garantida com segurança, conforto e dignidade. Reconhecer isso é o primeiro passo para reequilibrar nossas cidades, tirando o trânsito do piloto automático e colocando o ser humano no centro da mobilidade. No fim das contas, todos somos pedestres  — mesmo o motorista mais convicto, mais cedo ou mais tarde, estaciona o carro e segue o caminho com os próprios pés. É hora de lembrar disso não só no Dia do Pedestre, mas todos os dias.

  • ESTACIONAMENTOS: QUAL O PREÇO DESSA BRINCADEIRA?

    Apesar do que o título possa remeter, esse texto não tem relação com os custos relacionados aos acidentes (ou sinistros) de trânsito, tampouco com os investimentos (ou falta de) voltados à mobilidade. Enquanto revisitava um antigo artigo que aborda a questão do estacionamento de veículos particulares na via pública, a analogia nele utilizada me fez lembrar de outra situação semelhante. Como já mencionei em outra oportunidade, há alguns anos fui síndico do condomínio onde moro. Aqui, durante muitos anos, houve uma restrição bastante grande para alguns usos das áreas comuns do condomínio. Por esse motivo, certa feita, recebi a ligação de uma condômina que realizaria o aniversário do filho no salão de festas naquela tarde. Devido às modestas metragens do mesmo, ela questionava a possibilidade de utilizar parte do pátio em frente ao salão para a montagem de uma cama elástica. Uma vez que o próprio condomínio havia, há poucos dias, organizado uma festa para o dia das crianças com diversos brinquedos, atrações e guloseimas no mesmo pátio, considerei não haver nada que impedisse a utilização para os mesmos fins. Obviamente, desde que o brinquedo não atrapalhasse de nenhuma forma a circulação dos demais condôminos. No entanto, já antevendo os conflitos que poderiam surgir dessa decisão, inferi que dificilmente todas as crianças do condomínio seriam convidadas para o aniversário. Visto isso, achei justo alertá-la de que, embora permitisse a montagem do brinquedo, seria dela a responsabilidade de gerenciar o acesso ao mesmo. Assim como de gerir sua correta utilização, uma vez que estando em área de uso comum, em tese, o brinquedo poderia ser utilizado por quem quer que fosse, sendo ou não convidado da festa. Fico satisfeito ao lembrar que o “problema do pula-pula” fora resolvido de forma civilizada e democrática, que as crianças se divertiram bastantes durante a festa (tanto as convidadas quanto as demais crianças do condomínio). Embora exista sempre aquelas vizinhas que acham um absurdo, pois, segundo essas, o condômino paga para utilizar o espaço do salão, não o do pátio. Para essas, eu respondia, sempre com irreverência, que já estava providenciando uma grua para içar os convidados da portaria diretamente para o salão, para que eles não utilizassem sequer esse trajeto da área comum. Ironias à parte, pensemos de forma hipotética que, para esse mesmo aniversário, a condômina resolvesse reservar algumas vagas de estacionamento para os convidados em frente ao condomínio, já que o mesmo não dispõe de estacionamento para visitantes. Parece uma ideia um tanto estapafúrdia, não? Mas o que faz ainda tantas pessoas crerem que pelo fato de morarem nesse condomínio elas têm direito ao espaço na via imediatamente em frente às suas casas? Isso tem um preço para toda a sociedade… No meu primeiro livro, O Efeito Transformers em Trânsito , no qual tive o imenso prazer e alegria de poder contar com o prefácio escrito pelo grande amigo Celso Mariano, ele conta sobre a primeira vez em que ouviu a expressão “ os meninos crescem e o que muda é o preço dos brinquedos ”. Me pergunto às vezes se na vida adulta os brinquedos que se tornam demasiadamente caros, ou se nós simplesmente desaprendemos a brincar? Bem, se esse for o caso, ainda deveríamos descer para o play? Tem interesse pelo assunto? Gostaria de ler mais textos como esse? Então adquira agora o meu livro!

  • APOPTOSE SOCIAL OU NECROSE URBANA? ONDE ESTÁ A CURA PARA O CÂNCER DO TRÂNSITO

    Observando uma árvore que perde suas folhas no outono, é possível concluir o quanto o jornalista, político e escritor Humberto de Campos foi feliz quando escreveu: A natureza é sábia e justa. O vento sacode as árvores, move os galhos, para que todas as folhas tenham o seu momento de ver o sol. É muito difícil dizer com precisão o número de células que nascem e morrem em nosso organismo a cada dia, mas estima-se que o corpo de um adulto produza em média 300 milhões de células por minuto. Os tecidos do corpo humano possuem processos contínuos de renovação e reparação, que diminuem à medida que envelhecemos, até que o número de células que morrem ultrapassa o número de células que nascem. Você pode imaginar que a morte celular seja algo ruim para as células em seu corpo. Em muitos casos, isso é verdade: não é algo bom que as células morram por causa de uma lesão (por exemplo, de um arranhão ou um produto químico). A esses processos, dá-se o nome de NECROSE. Entretanto, também é importante que algumas células de nosso corpo possam morrer – não aleatoriamente, mas de forma cuidadosamente controlada. A esse processo, dá-se o nome de APOPTOSE. A apoptose remove as células durante o desenvolvimento, elimina as células potencialmente cancerosas e infectadas por vírus, por exemplo, e mantém o equilíbrio no corpo. Não pretendo me aprofundar nesses termos biológicos. A introdução se fez necessária, no entanto, para embasar uma teoria com a qual tive contato durante minha formação. Durante uma aula de Psicologia Experimental, ministrada pelo talentoso professor Vinícius Dornelles, foi a primeira vez que tive contato com o termo emprestado da biologia para a sociedade: Apoptose Social. Segundo o professor, haveria na sociedade algumas pessoas que levam em seus códigos genéticos um potencial autodestrutivo para um equilíbrio social. Prova disso seriam os frequentes confrontos bélicos travados no decorrer da história da humanidade. Contudo, devido à atual falta de guerras em âmbito global, a humanidade, como sempre, precisou buscar estratégias de manter o seu “equilíbrio”, tais como homicídios, latrocínios, discussões políticas, disputas esportivas ou, até mesmo, o nosso bom e velho trânsito! Embora me pareça extremamente acertada a teoria do professor Vinícius, minha opinião diverge à dele em alguns aspectos. O primeiro, já exposto no artigo A 3ª GUERRA MUNDIAL COMEÇOU. VOCÊ CONHECE O INIMIGO? , é que vivemos sim atualmente uma guerra que poucas pessoas têm conhecimento e outras tantas fingem não ver. Uma guerra silenciosa, porém tão violenta quanto as outras e que mata não só na Síria, nos Estados Unidos, mas também aí na frente da sua casa! Que mata no mundo todo: O TRÂNSITO. O segundo aspecto diz respeito à organização do processo. A apoptose é um processo organizado, é uma forma de morte celular programada, ou “suicídio celular”. Ela é diferente da necrose, na qual as células morrem devido a um dano, de forma desorganizada. A necrose ocorre quando há a falta de irrigação do suplemento sanguíneo para as células, provocando a sua deterioração. A origem da palavra está no grego nékrosis , que significa literalmente “morte” ou “mortificação”. Diferente da apoptose, a necrose não busca desenvolvimento. Poderíamos, então, pensar num processo de NECROSE URBANA? No qual, por falta de irrigação de investimentos em infraestrutura, educação e segurança, cerca de 1,2 milhões de “células” morrem anualmente em uma luta desenfreada e descontrolada contra um câncer que parece, assim como todos os outros, estar longe de ter cura. Em tempos de eleições presidenciais, vamos escolher com cuidado quais “células pré-cancerosas” queremos manter no nosso sistema de trânsito.

  • ADEUS COM GPS: A DESPEDIDA QUE LEVOU UM TWINGO AOS ANDES

    Quem disse que carro velho se despede com anúncio no OLX e chave jogada na gaveta? Uma família gaúcha resolveu dar um fim digno ao seu Twingo 1994, aquele simpático carrinho de duas portas que, vamos admitir, parece mais um mascote de quatro rodas do que um veículo propriamente dito. Mas não foi qualquer adeus. Nada de guincho, ferro-velho ou aquela lágrima contida na hora de trocar o documento no Detran. O destino escolhido foi digno de roteiro de cinema: cruzar a Cordilheira dos Andes. Sim, isso mesmo. Um carro que já estava na fase da aposentadoria rodou mais de 6.500 km numa aventura que misturou emoção, altitude e, possivelmente, um frasco de óleo reserva no porta-luvas. Sérgio, o patriarca e idealizador da jornada de despedida, não quis apenas "se desfazer" do carro. Quis honrá-lo. Afinal, o Twingo fazia parte da família há gerações, servindo de cenário para discussões sobre boletos, trilha sonora de brigas com GPS e companheiro silencioso de cochilos infantis no banco de trás. Com ele embarcaram a esposa, Cindy, e o filho, Hugo — que provavelmente só aceitaram a empreitada depois de garantir que haveria Wi-Fi em Mendoza. Foram R$ 7.500 investidos, o que, convenhamos, é mais barato do que muitos casamentos — e, neste caso, com certeza mais divertido. A chegada à capital gaúcha aconteceu no dia 12 de junho. Coincidência ou não, Dia dos Namorados. Talvez a data mais simbólica possível para um retorno tão afetivo. Afinal, tem coisa mais romântica do que sobreviver juntos a uma travessia de 6.000 km com o ar-condicionado funcionando só na descida? Agora, o Twingo descansa. Mas a história continua. E você? Vai se despediria do seu carro como? Aqui vão algumas ideias nada convencionais: Festa de aniversário do carro : com direito a bolo no formato do modelo, velas no escapamento e “Parabéns pra você” cantado em bossa nova no rádio AM. Enterro simbólico : uma cerimônia no quintal ou garagem, com discursos emocionados, depoimentos sobre “a vez que ele não pegou na chuva” e coroas de flores feitas com aromatizantes de retrovisor. Carro-tour da saudade : um último passeio por todos os lugares marcantes — da autoescola onde você o arranhou pela primeira vez até o drive-thru onde ele ficou entalado na lombada. Ritual de passagem : entregue o carro a um novo dono com direito a rito cerimonial, transmissão simbólica do manual do proprietário e um CD do Skank de brinde. Mostra "Retratos de um Motorista" : transforme as fotos de viagens, multas e estacionamentos desastrosos em uma exposição artística — com curadoria sua e legenda irônica garantida. Porque, no fim das contas, todo carro é um pouco mais do que apenas um carro. É memória sobre quatro rodas. E algumas memórias merecem o tanque cheio, os vidros abertos e um adeus com gosto de estrada.

  • QUEM ESTÁ CONDUZINDO NOSSOS FILHOS? OS RISCOS DO TRANSPORTE ESCOLAR INFORMAL

    Quando minha enteada iniciou no ensino fundamental, utilizamos um serviço de transporte escolar regular, com motorista conhecido, veículo identificado e todos os cuidados básicos de segurança. Porém, a tranquilidade durou apenas até a metade do ano letivo. Com a mudança para um novo bairro, mais distante da escola, nos deparamos com um desafio que muitas famílias certamente conhecem: a limitação territorial dos serviços de transporte escolar. Na nova residência, localizada na zona sul da cidade, fomos informados de que a van que atendia nosso antigo endereço não poderia continuar nos atendendo. Por sua vez, a van responsável pela nova região operava com uma peculiaridade perigosa: um pai de aluno, que morava no extremo sul, assumia por conta própria a função de condutor de um pequeno grupo de crianças — entre elas, a minha enteada. Ele as levava até um ponto de encontro, onde então eram transferidas para a van regular que seguia até a escola. À primeira vista, parecia uma solução prática, até solidária. Mas, ao olhar com mais cuidado, percebemos o quanto essa prática colocava em risco não apenas a segurança física das crianças, mas também a responsabilidade legal dos envolvidos. O perigo por trás da “ajuda” Apesar da boa intenção, o transporte escolar informal é uma prática preocupante. Muitos pais, pressionados pela rotina, confiam seus filhos a motoristas improvisados — vizinhos, parentes, conhecidos — sem verificar se essas pessoas estão devidamente habilitadas ou preparadas para a função. O transporte escolar é uma atividade que exige não apenas a habilitação específica  (categoria D, com curso especializado) e experiência , mas também preparo emocional e psicológico , além de cuidados com o próprio veículo: manutenção constante, equipamentos obrigatórios, e adequação à legislação de trânsito. Quando uma criança é conduzida por alguém sem essa qualificação, em um veículo sem autorização para transporte escolar, estamos diante de uma negligência que pode ter consequências trágicas — e infelizmente, não são raros os casos em que essas situações acabam em acidentes ou conflitos legais. A confiança precisa estar amparada na responsabilidade É compreensível que as famílias recorram a soluções alternativas quando o serviço formal não alcança certas regiões ou quando há limitações financeiras. No entanto, é fundamental lembrar que crianças são passageiros extremamente vulneráveis. A logística não pode ser mais importante do que a segurança. Além disso, vale reforçar que a responsabilidade por um acidente, nesses casos, pode recair tanto sobre quem transporta quanto sobre quem autoriza ou consente o transporte informal. Por um transporte escolar seguro e profissional Garantir um transporte escolar seguro  significa valorizar a vida, o bem-estar emocional das crianças e a tranquilidade das famílias. Isso começa com a qualificação dos condutores , passa pela regulamentação dos veículos  e se estende ao compromisso ético de quem assume essa função todos os dias. Se você atua ou deseja atuar na área, ou se conhece alguém que transporta crianças, incentive a profissionalização. No meu site, ofereço um curso completo de formação e atualização de condutores de transporte escolar , com conteúdos atualizados, voltados para a prática segura e responsável. Acesse:👉 Curso de Transporte Escolar Porque no trânsito — especialmente quando se trata de crianças — o improviso pode custar caro demais.

  • O GOVERNO COMEÇA PELO FIM: O QUE O FIM DAS AUTOESCOLAS REVELA SOBRE NOSSAS PRIORIDADES

    Durante quatro anos, fui cobrador de ônibus. Uma profissão que, em Porto Alegre, está em vias de extinção sob o pretexto de baratear a operação do sistema. Aquilo que muitos diziam ser impossível hoje é realidade na maioria das linhas da cidade: o passageiro embarca, aproxima seu cartão do validador ao lado da roleta e segue viagem, sem maiores complicações. Para os que ainda usam dinheiro — como os Incas e os Astecas —, o pagamento é feito ao motorista, que libera a catraca antes de seguir trajeto. Ainda que a operação do transporte público possa funcionar sem cobradores, diversas melhorias poderiam — ou deveriam — ter sido implementadas antes, como o pagamento pré-embarque em estações tipo metrô, a priorização semafórica como nos sistemas BRT, a reformulação de linhas sobrepostas... Enfim, após essas mudanças estruturais, talvez a retirada desses profissionais fizesse mais sentido. De forma semelhante, o atual Ministro dos Transportes, Renan Filho, anunciou recentemente a intenção de tornar facultativas as aulas em autoescola para quem deseja obter a CNH. Viável? Sim. Mas será mesmo essa a melhor alternativa diante do atual cenário de violência no trânsito brasileiro? Estamos prestes a extinguir a única etapa em que, de maneira sistemática, o condutor recebe algum tipo de educação para o trânsito. Antes disso, não seria mais sensato implementar outras medidas previstas pelo próprio Código de Trânsito Brasileiro, como a educação para o trânsito desde a infância até o ensino superior? E quanto à fiscalização eficiente, à proibição da venda de veículos com baixa avaliação de segurança, ou à urgente melhoria da infraestrutura das nossas rodovias? Ao decretar o fim das autoescolas, mais uma vez, parece que o governo começa pelo fim. Fico aqui imaginando: qual será o próximo passo para “facilitar” a vida do cidadão e enxugar os gastos públicos? Implantar educação domiciliar para que estudantes não precisem mais gastar com tênis e o governo, com merenda e reajustes salariais desnecessários? Oferecer medicina por correspondência no SUS? Ou criar um tribunal do júri permanente, onde o próprio povo defende, acusa e julga, dispensando advogados, promotores e juízes? O futuro certamente nos reserva medidas viáveis — mas muitas delas estão longe de ser as ideais para a sociedade que desejamos construir.

  • GERENCIAMENTO DO RISCO NO TRÂNSITO

    Inquieto como sempre, há alguns meses comecei a me aventurar no mercado financeiro, do qual tomei emprestado o termo gerenciamento (ou gestão) do risco. Todo o investimento, seja em renda fixa ou variável, pressupõem riscos, podendo, conforme o caso, serem maiores ou menores. Gerenciar esses riscos significa tentar evitar perdas e, quando não for possível evitá-las, tentar diminuir a frequência ou severidade das perdas, entendendo-se frequência de perdas como a quantidade de vezes que a perda ocorre, enquanto a severidade seria o custo do prejuízo decorrente da perda. Voltando ao âmbito do trânsito, o Maio Amarelo , que é um movimento internacional de conscientização para redução de acidentes de trânsito, traz esse ano uma campanha que me parece ser fundamental: Perceba o risco. Proteja a vida! A grande sacada está na primeira palavra do slogan da campanha, pois, tanto no mercado financeiro quanto no trânsito, para que se possa gerir os riscos, antes de mais nada, é necessário percebê-los. Porém, antes de me ater aos já vastamente mencionados riscos inerentes ao trânsito, gostaria de convidá-lo, estimado leitor, a fazer um breve resgate histórico dos percursos humanos com relação à mobilidade. Historicamente, o ser humano passou a cultivar de forma doméstica o próprio alimento há pouquíssimo tempo, há aproximadamente 10 mil anos. Nos demais 2,5 milhões de anos de sua existência, antes da revolução agrícola, o ser humano subsistia em pequenos grupos da caça e da coleta de grãos. Por depender desses insumos naturais, assim que esses tornavam-se escassos na sua região, ou que sua prole crescia, esses grupos eram obrigados a migrar para regiões de maior abundância. Nesses processos migratórios, o advento da roda teve, inegavelmente, um importante papel, pois possibilitou ao homem capacidade não apenas de transportar mais mantimentos como de ampliar sua área exploratória. Entretanto, imagine que em determinada ocasião, na busca por um novo local que pudesse prover seu sustento temporariamente, um grupo se depara às margens de um grande manancial que o separa de terras fartas de possíveis recursos escondidos nas margens opostas. Não satisfeito, o ser humano criou pequenas embarcações que, com o passar das gerações, transformaram-se em pequenas naus, até virarem gigantescos navios transatlânticos. Contudo, alguns séculos mais tarde, durante uma morosa e maçante travessia náutica, o homem que estava no convés olha para o céu e vê os pássaros planando no ar numa célere e acrobática viagem e deseja também ganhar os ares. Eis que, ganhando os céus, não satisfeito, ele almeja o espaço e, após chegar a lua, já planeja colonizar outros planetas. Tudo numa espantosa velocidade que parece aumentar a cada dia. Toda essa viagem no tempo apenas por dois simples motivos: o primeiro para mostrar que o ser humano é um transpositor de limites nato; o segundo – que está diretamente ligado a essa característica – é que somos naturalmente aficionados por velocidade. Velocidade que é um tema que já me dispus a falar em REDUÇÃO DE VELOCIDADE: PRECISAMOS FALAR SOBRE ISSO e em VELOCIDADE NO TRÂNSITO: O PROBLEMA QUE AVANÇA 17 M/S , e que no meu ponto de vista é o fator que mais traz riscos no trânsito. E o maior risco se dá justamente por esse fator histórico que o automóvel é capaz de aguçar. Ele possibilita que o homem ultrapasse os limites do seu próprio corpo, tornando-se senhor do espaço e do tempo e chegando a lugares aos quais jamais chegaria com os próprios pés e com a mesma velocidade. Sobretudo quando, com a crescente tecnologia veicular, os automóveis têm sido equipados com cada vez mais itens de segurança, passando ao condutor um sentimento de falsa onipotência, que acaba, quase sempre, sendo transferido ao pedal da direita. Enquanto isso, seguimos trabalhando para que o resultado da equação predisposição humana a superar limites X percepção do risco seja, na medida do possível, positivo. Que o trânsito possa ser um investimento de risco cada vez menor, no qual os prejuízos, quando houver, não sejam na casa dos milhões, sobretudo quando o principal ativo for capital humano.

  • ACESSIBILIDADE: SUA CIDADE É DE FATO UM ESPAÇO DE TODOS?

    Escrita durante o processo de redemocratização do país após o fim da Ditadura Militar, a Constituição de 1988 ficou conhecida com Constituição Cidadã. Nela, encontra-se a lei fundamental e suprema do Brasil, que determina os direitos e os deveres dos entes políticos e dos cidadãos do nosso país. Foi resultado de um amplo debate que se estendeu durante mais de um ano e simbolizou o início da Nova República. Dentre os diversos direitos fundamentais assegurados pela nossa constituição está o Princípio Constitucional da Igualdade, expresso pelo artigo 5º, que diz: “ Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade ”. O inciso XV do mesmo artigo assegura a todos o direito de ir e vir, quando prevê “ livre locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens ”. Entretanto, apenas após 12 anos, através da LEI Nº 10.098, de 19 de dezembro de 2000, o país estabeleceu normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida. Segundo essa lei, acessibilidade consiste em: “ possibilidade e condição de alcance para utilização, com segurança e autonomia, de espaços, mobiliários, equipamentos urbanos, edificações, transportes, informação e comunicação, inclusive seus sistemas e tecnologias, bem como de outros serviços e instalações abertos ao público, de uso público ou privados de uso coletivo, tanto na zona urbana como na rural, por pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida ” É importante lembrar que a dificuldade não é só do cego ou do usuário de cadeiras de rodas. Existem pessoas com mobilidade reduzida e temporária, gerada por diversos fatores, tais como: idade, gravidez, deficiência auditiva ou visual e acidentes, que levam as pessoas temporariamente ficarem com dificuldades de locomoção. A Lei supracitada ainda atribui ao Poder Público, no seu artigo 24º, a responsabilidade de promover campanhas informativas e educativas dirigidas à população em geral, com a finalidade de conscientizá-la e sensibilizá-la quanto à acessibilidade e à integração social da pessoa portadora de deficiência ou com mobilidade reduzida. O que não se encontra nessa Lei é de quem é a responsabilidade de conscientizar o Poder Público de tal necessidade… Fonte: Portal Multiplix Enfim, se nossa Constituição Cidadã foi escrita de fato para todos os cidadãos, não sei ao certo. O que sei é que se o inciso XV do artigo 5º garante “ livre locomoção no território nacional em tempo de paz” , o termo “guerra no trânsito” me parece cada vez mais adequado.

  • VELOCIDADE NO TRÂNSITO: O PROBLEMA QUE AVANÇA 17 m/s

    Na física, velocidade diz respeito à variação da posição de um objeto no espaço em relação ao tempo, ou seja, qual a distância percorrida por um corpo num determinado intervalo temporal. Recentemente a OMS (Organização Mundial da Saúde) sugeriu que os países adotem limites máximos de velocidade em vias urbanas inferiores ou iguais a 50 km/h para tentar reduzir o número de mortes causadas por acidentes de trânsito. No Brasil, no entanto, contrariando a essa tendência mundial de redução de velocidade, alguns gestores públicos ainda são eleitos utilizando promessas que contrariam não só essa tendência, mas as próprias estatísticas acerca dessas reduções. Sem entrar no mérito da eficácia (já comprovada, diga-se de passagem) da redução de velocidade em perímetro urbano, quero me ater uma questão pouco (ou talvez nunca) debatida na área do trânsito: a falta de percepção do risco em relação à velocidade. Obviamente que se um candidato é eleito com a promessa de aumentar a velocidade máxima de determinada via é porque a maioria das pessoas desejam isso e entende essa medida como sendo segura e até mesmo necessária. Isso se dá porque a maioria das pessoas percebe a velocidade de 60 km/h como uma velocidade relativamente baixa. Mas será que a percepção dessas pessoas está correta? Bem, para responder a tal questão eu tenho uma teoria. Após apresentá-la, convido a você, caro leitor, a tirar então suas próprias conclusões. Antes de expô-la, entretanto, quero convidá-lo a uma rápida reflexão: o que são 60 km/h? Ou ainda, o que representa 1 km? Todos sabemos que 1 km é o equivalente a 1000 metros, correto? Ok, mas, em termos práticos, de maneira concreta, o que são 1000 metros? Talvez da sua casa até a escola das crianças? Ou até o supermercado? Complicado, não? E 1 hora? “Ora, essa é fácil, Rodrigo!” você deve ter pensado. Exatamente… 1 hora tem 60 minutos! Daqui onde eu moro, por exemplo, sei que se eu pegar meu carro e sair a uma velocidade de 60 km/h, durante 2 horas, eu chego ao litoral. Isso me dá uma boa noção da relação tempo X distância. Pelo menos na estrada… Mas e na cidade, volto a perguntar, o que significa 60 km/h? Na minha opinião a velocidade, sobretudo no perímetro urbano, deveria ser mensurada em m/s (metros por segundo). Isso, me parece, daria às pessoas uma noção mais palpável, mais concreta, do que representa a velocidade na qual elas trafegam. Façamos a mesma reflexão: em termos práticos, de maneira concreta, o que é 1 metro? Fácil, não? É um pouco mais que a distância que você está agora para a parede de trás da tela do seu computador… Ou então a distância ente você e seu colega sentado no computador ao lado… Ou simplesmente um passo bem largo de um adulto. E 1 segundo? Ora, pouco mais que o tempo que você gasta para estalar os dedos ou piscar os olhos! Sendo assim, poderíamos inferir que um carro que roda a 3 m/s, por exemplo, roda, em 1 piscar de olhos, a distância de 3 passos largos. Bem mais fácil, não? “Mas Rodrigo, como eu faço para saber a velocidade que o carro está em m/s?”. Para fazer a conversão de km/h para m/s basta realizar um simples cálculo que, mesmo eu, que não sou lá muito afeiçoado à matemática, consigo fazer: bastar dividir a velocidade do seu velocímetro por 3,6 que você terá a velocidade do seu veículo em metros por segundo. Sendo assim, um veículo que roda a 60 km/h percorre, aproximadamente, 17 m/s, o que, em termos práticos, dá, mais ou menos, a distância do seu portão até o do vizinho do outro lado da rua. Percebe a diferença? Aqui você pode estar se perguntando “Mas Rodrigo, onde está o risco a ser percebido nisso?” Eu lhe convido a fazer uma nova reflexão: imagine uma avenida aí na sua cidade, de preferência uma com um grande fluxo de pedestres. Nada? Ok, eu lhe ajudo… Tente lembrar de algum hospital, uma escola bem grande, um shopping ou centro comercial… lembrou? Então, naquela grande avenida que passa em frente a esse estabelecimento estão passando dezenas e dezenas de carros por minuto, todos a uma velocidade de 60 km/h, ou melhor… 17 m/s (em tese, pelo menos!). Especialistas afirmam que o tempo de reação de um condutor em condições normais é de 1 segundo aproximadamente. Ou seja, na eventualidade de uma situação de risco, o condutor leva em média 1 segundo para começar a frear. Lá se vão 17 metros… Soma-se a isso a distância necessária até que o veículo pare completamente, que, em um carro de passeio, com cerca de 1 tonelada e em condições normais, a essa velocidade, varia em torno de 25 metros. Isto é, somando-se o tempo de reação + a distância de parada, teríamos percorrido mais de 40 metros até o carro parar completamente! Perceba que eu sempre frisei “em condições normais”, seja para o veículo, seja para a via ou seja para o condutor. Imagine isso tudo ao contrário… Um veículo maior, sem as devidas manutenções realizadas, com pneus “carecas”, com o sistema de freio ineficiente e acima da velocidade permitida. Assim como uma via mal pavimentada, com água, óleo ou areia. E, para completar, um condutor desatento, cansado, com sono ou sob influência de algum medicamento ou droga. “Mas aí você tá sendo muito pessimista, Rodrigo…”. Ok, minha reflexão pode não ter sido o suficiente para alertá-lo dos riscos da velocidade no trânsito. Se esse é o seu caso, peço que, um última vez, faça outra rápida reflexão: Imagine agora, nessa mesma avenida, nas mesmas condições acima, venha um carro a 60 km/h… ou 17 m/s, enquanto sua mãe, esposa ou filhos atravessassem. Você iria querer que ele mantivesse a mesma velocidade ou que a reduzisse?

  • O QUE A CHINA FEZ NOS TRILHOS E O BRASIL AINDA PROJETA NO POWERPOINT

    Entre 2008 e 2024, a China saiu da estação da dependência rodoviária e chegou, em alta velocidade, ao topo do mundo ferroviário. Em apenas 16 anos, sua malha ferroviária total saltou de cerca de 98 mil quilômetros para mais de 160 mil quilômetros, com quase um terço disso, mais de 45 mil quilômetros dedicado exclusivamente à alta velocidade. Hoje, os chineses detêm dois terços de toda a malha de trens-bala do planeta. E isso não é exagero de discurso político, é dado técnico publicado em fontes como Brilliant Maps, Le Monde e SCMP. Tudo começou em 2008 com os Jogos Olímpicos de Pequim, quando a primeira linha de alta velocidade entrou em operação. De lá pra cá, bilhões foram investidos, linhas conectaram desertos a metrópoles, e o país construiu estações ferroviárias com a mesma frequência que a gente muda de ministro. Enquanto isso, o Brasil, sempre entusiasmado com anúncios e promessas, continuou firme com seus mesmos 30 mil quilômetros de trilhos dos quais, segundo a AEEFSJ (Associação de Engenheiros Ferroviários), apenas 12 mil estão em condições reais de uso. Aliás, nesse mesmo período, enquanto a China colocava em operação uma nova linha HSR por mês, o Brasil seguia orgulhoso com planos como o Trem Bala São Paulo–Rio (anunciado em 2007, reapresentado em 2010, morto em silêncio e enterrado no esquecimento institucional). A Ferrovia Norte-Sul, por sua vez, virou a eterna obra “em fase de conclusão”. A diferença é que os chineses ligaram cantões, enquanto nós seguimos ligando powerpoints. E tem mais: a China construiu trens que cruzam milhares de quilômetros em poucas horas. Já no Brasil, se você tentar ir de um estado ao outro de trem, só vai se houver uma Maria Fumaça turística operada por uma ONG com verba do ProAC. Nada contra o turismo ferroviário, mas ele não deveria ser a espinha dorsal da mobilidade de um país continental. Ah, claro, não podemos esquecer a justificativa clássica: “ferrovia no Brasil não é viável por causa da nossa topografia”. Curioso é que essa mesma geografia não impediu o avanço de mineradoras e oleodutos. Aparentemente, dificuldade de engenharia só existe quando o transporte é público e de interesse coletivo. Enquanto a China enfrenta agora os efeitos de um eventual excesso de ambição ferroviária, com estações fantasmas e uma dívida que assombra seus bancos, o Brasil ainda vive os efeitos da crônica falta de ambição: cidades sem transporte decente, logística cara, frete lento, e um país que continua dependente de rodovias esburacadas e caminhões superexplorados. Enquanto uns construíram o futuro sobre trilhos, outros seguem patinando no barro da burocracia. E o tempo, esse sim, não para, principalmente quando o relógio está dentro de um trem-bala chinês. Fontes : Brilliant Maps, Le Monde, South China Morning Post, Railway-Technology, Wikipedia (versões inglesa e portuguesa), SCMP Autor : Carlos Alberto Tavares Ferreira , Founder e CEO da Carbon Zero

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