O GOVERNO COMEÇA PELO FIM: O QUE O FIM DAS AUTOESCOLAS REVELA SOBRE NOSSAS PRIORIDADES
- Rodrigo Vargas
- 5 de ago.
- 2 min de leitura

Durante quatro anos, fui cobrador de ônibus. Uma profissão que, em Porto Alegre, está em vias de extinção sob o pretexto de baratear a operação do sistema. Aquilo que muitos diziam ser impossível hoje é realidade na maioria das linhas da cidade: o passageiro embarca, aproxima seu cartão do validador ao lado da roleta e segue viagem, sem maiores complicações. Para os que ainda usam dinheiro — como os Incas e os Astecas —, o pagamento é feito ao motorista, que libera a catraca antes de seguir trajeto.
Ainda que a operação do transporte público possa funcionar sem cobradores, diversas melhorias poderiam — ou deveriam — ter sido implementadas antes, como o pagamento pré-embarque em estações tipo metrô, a priorização semafórica como nos sistemas BRT, a reformulação de linhas sobrepostas... Enfim, após essas mudanças estruturais, talvez a retirada desses profissionais fizesse mais sentido.
De forma semelhante, o atual Ministro dos Transportes, Renan Filho, anunciou recentemente a intenção de tornar facultativas as aulas em autoescola para quem deseja obter a CNH. Viável? Sim. Mas será mesmo essa a melhor alternativa diante do atual cenário de violência no trânsito brasileiro? Estamos prestes a extinguir a única etapa em que, de maneira sistemática, o condutor recebe algum tipo de educação para o trânsito.
Antes disso, não seria mais sensato implementar outras medidas previstas pelo próprio Código de Trânsito Brasileiro, como a educação para o trânsito desde a infância até o ensino superior? E quanto à fiscalização eficiente, à proibição da venda de veículos com baixa avaliação de segurança, ou à urgente melhoria da infraestrutura das nossas rodovias?
Ao decretar o fim das autoescolas, mais uma vez, parece que o governo começa pelo fim.
Fico aqui imaginando: qual será o próximo passo para “facilitar” a vida do cidadão e enxugar os gastos públicos? Implantar educação domiciliar para que estudantes não precisem mais gastar com tênis e o governo, com merenda e reajustes salariais desnecessários? Oferecer medicina por correspondência no SUS? Ou criar um tribunal do júri permanente, onde o próprio povo defende, acusa e julga, dispensando advogados, promotores e juízes?
O futuro certamente nos reserva medidas viáveis — mas muitas delas estão longe de ser as ideais para a sociedade que desejamos construir.
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