Vendo aquele vendedor de DVDs piratas que fica na saída do supermercado, me pus a pensar em como nossa forma de assistir filmes mudou nos últimos dez anos… Naquela época, se quiséssemos assistir um filme nós simplesmente comprávamos o título escolhido, pagando muitas vezes um valor bem salgado. Ou, como muita gente costumava fazer, recorria aos piratas por um valor bem mais acessível.
Mas, de uns anos pra cá, com o surgimento das plataformas de streaming, nossos hábitos cinematográficos se transformaram por completo. Porém, a transformação não parou por aí. Assim como os filmes, nossa forma de ouvir música, de comer e até de viajar se rendeu ao modelo on demand.
Entretanto, ao mesmo tempo eu me questiono: e nossas formas de deslocar pela cidade mudaram tanto nos últimos dez anos? Obviamente houve avanços, como uma meia passagem aqui, um cartão para pagamento ali e um sistema integrado acolá. Mas nem de longe o sistema de transporte público acompanhou a evolução tecnológica e, usando um modelo que vem se mostrando falho há décadas, parece ter parado quase que completamente no tempo.
Pensando nisso, em 1996, o cientista de dados finlandês Sampo Hietanen propôs um modelo que viria a se tornar o embrião do conceito de mobilidade como serviço (ou Maas-do inglês Mobility As A Service). Dez anos depois, durante uma conferência de turismo na Áustria, o cientista propôs um modelo de pacotes de mobilidade através da criação de um assistente inteligente de informações. Mas foi apenas em 2014 que Hietnan finalmente explicou o modelo de mobilidade como serviço para uma plateia de 200 pessoas, durante um evento de tecnologia em Helsinque, capital da Finlândia.
Mas, afinal, o que é mobilidade como serviço?
Mobilidade como serviço (Maas) é um conceito que busca oferecer a mobilidade urbana de forma integrada a diferentes modais de transporte e formas de pagamento. Utilizando o exemplo dos filmes, mencionado no início do texto, imagine ter um serviço que fosse uma espécie de “Netflix do Transporte”, em que mensalmente pagássemos uma taxa para usufruir de toda base ali oferecida, dando acesso a um pacote de serviços integrados, que disponibilizasse desde transporte individual por aplicativo a ônibus e trens intermunicipais, por exemplo. Helsinque é considerado o primeiro caso de sucesso da Maas. Desde 2016, por meio do aplicativo Whim, os cidadãos da capital finlandesa podem pagar todos os serviços de transporte da cidade, públicos ou privados.
No Brasil, o transporte passou a ser considerado um direto social apenas em 2015, através da Proposta de Emenda à Constituição n° 74, de 2013. No entanto, embora o Maas pareça algo extremamente inovador, esse é um modelo já há muito conhecido por nós. Não no transporte, obviamente. Mas em outro direito social, que passou a ser assegurado a todos muito antes do lançamento do aplicativo de transporte finlandês, da Netflix ou mesmo do primeiro DVD. Trata-se do nosso localmente criticado, porém mundialmente elogiado Sistema Único de Saúde, também conhecido como SUS.
Sem entrar na polêmica efetividade do sistema, mesmo porque o tema aqui não é saúde, pelo menos não diretamente. Se o SUS tem seus problemas está mais que evidente que o atual sistema de transporte também os tem. Enfim, me parece urgente que o “filme da nossa mobilidade” seja rebobinado e revisto. Que façamos melhor uso dos benefícios que a tecnologia pode nos dar no dia a dia, antes que a pirataria, à exemplo dos filmes, tome conta também dos transportes.
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