O RIO GRANDE DO SUL VOLTANDO AOS TRILHOS. SERÁ?
- Rodrigo Vargas

- 15 de ago.
- 3 min de leitura

A Serra Gaúcha é um dos principais destinos turísticos do Brasil. Gramado, Canela e arredores recebem milhões de visitantes todos os anos, atraídos por paisagens serranas, gastronomia, eventos de grande porte e uma estrutura hoteleira robusta. O impacto econômico do turismo na região é imenso: movimenta restaurantes, hotéis, comércio e gera milhares de empregos diretos e indiretos. Porém, o acesso, especialmente em períodos de alta temporada, se transforma em um desafio logístico. Engarrafamentos quilométricos na BR-116 e RS-115 se tornaram parte do “roteiro” — e não no sentido positivo.
Vale lembrar que o Rio Grande do Sul já teve uma presença ferroviária marcante. No final do século XIX e início do XX, linhas da Viação Férrea do Rio Grande do Sul (VFRGS) e, posteriormente, da Rede Ferroviária Federal, conectavam Porto Alegre a diversas regiões do Estado, incluindo a Serra. Trens de passageiros transportavam tanto mercadorias quanto pessoas, e eram parte essencial da integração econômica e social. Essa malha, no entanto, foi sendo desativada a partir da segunda metade do século XX, em meio à priorização do transporte rodoviário e à falta de investimentos. Hoje, restam poucos trechos ativos para transporte de passageiros, basicamente com fins turísticos, como o Trem do Vinho, entre Bento Gonçalves e Carlos Barbosa.
Foi nesse contexto que, em agosto de 2025, o governo do Rio Grande do Sul anunciou a assinatura do contrato com o consórcio SulTrens para a construção de um trem ligando Porto Alegre a Gramado. O investimento previsto é de R$ 4,5 bilhões, totalmente privado, e a linha de cerca de 84 quilômetros promete fazer o trajeto em aproximadamente uma hora. Os trens híbridos (elétrico e diesel) terão capacidade para 250 passageiros, velocidade máxima de 130 km/h e recursos de conforto como poltronas reclináveis, Wi-Fi e serviços de bordo. A expectativa é que a operação comercial comece em 2032.
O anúncio gerou entusiasmo, mas também levantou questionamentos. No meu artigo “O que a China fez nos trilhos e o Brasil ainda projeta no PowerPoint”, destaquei o salto impressionante da malha ferroviária chinesa: saindo praticamente do zero em 2008 para cerca de 48 mil quilômetros de linhas de alta velocidade até o final de 2024 — com previsão de chegar a 50 mil em 2025 e 60 mil em 2030. Enquanto isso, aqui projetamos para os próximos sete anos um único trecho de 84 km.
Outro ponto de debate é o uso do trem. O projeto, apesar de ter potencial para aliviar o tráfego e servir como alternativa de transporte regional, nasceu com vocação predominantemente turística. Inicialmente, não estão previstas estações intermediárias — o que restringe sua função para a mobilidade cotidiana de quem vive ao longo do trajeto. Futuramente, há possibilidade de inclusão de até duas paradas adicionais, mas isso dependerá de estudos e viabilidade comercial.
A pergunta que fica é: estamos aproveitando essa oportunidade apenas para criar mais uma atração turística ou para repensar a mobilidade de forma integrada? Em um cenário onde grandes centros sofrem com congestionamentos, poluição e perda de produtividade, apostar em trens não deveria ser só uma questão de turismo, mas também de transporte público eficiente e sustentável.
Enquanto a China segue construindo milhares de quilômetros de ferrovias por ano, nós ainda discutimos se um trem pode ou não parar para pegar passageiros no caminho. Talvez, para avançarmos, seja necessário parar de pensar apenas no “roteiro” e começar a pensar na “rede”.














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