IFOOD COMEÇA A FAZER ENTREGAS POR DRONE NO BRASIL
- Rodrigo Vargas

- 14 de out.
- 4 min de leitura

Durante a pandemia, escrevi outro artigo onde refletia sobre a praticidade que seria se entregas fossem feitas por drones. Eis que o futuro das entregas aéreas no Brasil acaba de ganhar um marco importante. Após autorização permanente concedida pela Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), o iFood retomou em Sergipe suas operações de entrega por drones, em parceria com a Speedbird Aero. Trata-se da primeira autorização do tipo para voos sobre áreas com circulação de pessoas, um passo decisivo para a consolidação da logística aérea no país.
Mas o que isso representa na prática? Quais os impactos logísticos, regulatórios e sociais desse movimento? E, principalmente, até onde os drones podem de fato transformar a maneira como recebemos produtos?
Velocidade e eficiência: o ganho imediato
A rota escolhida é bastante simbólica. Os drones vão percorrer pouco menos de 4 km entre o Shopping RioMar, em Aracaju, e condomínios residenciais na Barra dos Coqueiros. Um trajeto que, por terra, pode levar até uma hora, mas que pelo ar é reduzido para cerca de 20 a 30 minutos.
Além da agilidade, há também o ganho em capacidade. Os novos modelos homologados pela ANAC permitem transportar até 5 kg por voo — antes, o limite era de 3 kg — o que amplia o tipo de pedidos possíveis e aumenta a eficiência das operações. A expectativa é de atender até 280 pedidos por dia nessa rota, um número expressivo para uma fase inicial, mas que ainda representa mais um laboratório do que uma substituição em larga escala.
O papel da “última milha”
É importante lembrar que os drones não eliminam os entregadores humanos. Pelo contrário, eles continuam responsáveis pela chamada “última milha”: do ponto de pouso até a porta do cliente. Na prática, o drone funciona como um atalho aéreo que encurta distâncias críticas, mas a experiência de entrega permanece híbrida.
Essa característica é central para entender o futuro do trabalho nesse setor. Em vez de substituir, os drones tendem a modificar o papel do entregador, que passa a atuar em rotas mais curtas, com foco na interface final com o consumidor. É uma mudança que exige adaptação, mas que também abre espaço para requalificação profissional.
Limites e desafios operacionais
Apesar do avanço, é preciso olhar para os limites dessa tecnologia.
Capacidade restrita: 5 kg por voo é um salto em relação ao passado, mas continua limitado. Pedidos maiores ou múltiplos ainda exigem transporte terrestre.
Condições climáticas: ventos fortes, chuva ou baixa visibilidade podem inviabilizar voos, obrigando o uso de rotas alternativas.
Custos de infraestrutura: a manutenção da frota, os centros de controle e os chamados “droneports” representam um investimento significativo. Isso significa que, no curto prazo, os drones farão mais sentido em trajetos específicos e de alta demanda, como regiões com barreiras naturais (rios, morros, travessias).
Portanto, ao contrário da visão futurista de drones substituindo motos em massa, o que teremos é um modelo complementar, pensado para rotas estratégicas.
Implicações regulatórias: o verdadeiro marco
Se no campo logístico os avanços são graduais, no campo regulatório o impacto é profundo. A autorização da ANAC representa o primeiro aval permanente para voos sobre áreas urbanas com circulação de pessoas. Isso estabelece um precedente técnico e jurídico que pode abrir caminho para novos players no setor.
Ao mesmo tempo, a decisão traz novos desafios regulatórios:
Gerenciamento do espaço aéreo: será necessário integrar os drones ao sistema de controle de tráfego, criando corredores aéreos e evitando conflitos com helicópteros e aviões.
Segurança e responsabilidade: em caso de queda, colisão ou dano a terceiros, quem responde? A ANAC deve avançar em normas de seguro obrigatório e definição clara de responsabilidades entre operadores e contratantes.
Privacidade e ruído: drones sobre áreas residenciais levantam preocupações legítimas sobre filmagens, ruídos e horários de operação. Aqui, o diálogo com comunidades locais será essencial para garantir aceitação social.
Oportunidades de política pública
Para além do mercado de entregas de refeições, os drones podem ter usos sociais estratégicos. Em áreas de difícil acesso, podem levar medicamentos, vacinas ou até insumos de emergência. Em regiões insulares ou com infraestrutura precária, podem reduzir desigualdades logísticas. A autorização da ANAC, portanto, não é apenas um benefício ao setor privado, mas uma abertura para usos públicos e humanitários.
Conclusão: um passo importante, mas não a revolução imediata
A retomada do iFood em Sergipe é um marco simbólico e técnico para a logística brasileira. Mostra que a tecnologia é viável, que há ganhos reais de tempo e eficiência, e que o regulador está disposto a avançar nesse terreno.
Mas é preciso manter o olhar crítico: os drones não vão substituir o transporte terrestre em larga escala. Eles serão complementares, úteis em rotas estratégicas e em contextos específicos. A revolução, se vier, será incremental — construída com cautela, regulação robusta e integração social.
No fim, o verdadeiro impacto talvez não esteja na pizza que chega mais rápido, mas na possibilidade de criar um novo ecossistema de mobilidade aérea, capaz de transformar a logística urbana e até salvar vidas em cenários críticos.
Referências
Infomoney – iFood retoma operações com drones em Sergipe para reforçar estratégia multimodal (2025).
Tecnoblog – iFood retoma entregas por drones no Brasil após aval da ANAC (2025).
O Globo – Após aval da ANAC, iFood retoma entregas por drones em Sergipe (2025).















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